Aconteceu o previsto: um ex-presidente foi condenado. E agora?

Originalmente publicado em Seguinte: em 25 de Janeiro de 2018

Não farei nenhuma análise da dimensão jurídica do julgamento, pois isso seria me meter em uma área que não domino satisfatoriamente – e de jurista de Facebook a internet está lotada. Todos sabem que a segunda instância manteve, por unanimidade, a condenação do ex-presidente Lula, inclusive aumentando em alguns anos a sua pena. Por um lado, “coxinhas” comemoram como se o país tivesse entrado em uma nova era, sem corrupção e impunidade (que era, aliás, o que eles diziam no impeachment de Dilma, o que é difícil de ainda levar à sério depois de quase 2 anos de Geddel, Joesley, Aécio, Temer, Eliseu Padilha, Jucá, etc.). Por outro lado, “petralhas” acreditam que esse é o ápice do “golpe” iniciado em 2016, com a consolidação de uma “jurídico-midiática” e a condenação sem provas de um homem inocente.

O fato, porém, é que o Judiciário brasileiro, em suas primeiras e segunda instâncias, funcionou. Praticamente todos os políticos que caíram nas mãos de Sérgio Moro e do TRF-4 foram condenados, incluindo membros do PMDB, como Cunha e Sérgio Cabral. Ou seja, a narrativa de que existe uma perseguição apenas contra o PT não parece se manter de pé. Não temos como saber como ele se comportaria com tucanos, pois esses conseguiram todos escapar com o foro privilegiado, onde os processos param no STF (até agora, nenhuma sentença sobre a Lava-Jato foi proferida no Supremo).

É possível que o MPF e o Judiciário, pelo menos em suas instâncias inferiores, tenham fustigado igualmente esquerda e direita. A direita, porém, tem muito mais poder e soube se defender. Ela, pelo menos em sua versão tucana, tem a seu favor a maior parte da mídia do centro do país, Gilmar Mendes e a conivência da maior parte da classe média (que é quem acaba pesando no jogo político), que é antipetista e considera os corruptos do PMDB, DEM e PSDB um mal menor em relação aos petistas. Deltan Dallagnol, o homem do Power Point, responsável pela acusação que condenou Lula, foi acusado de petista e bolivariano por jornalistas da Globo como Guilherme Fiuza. Janot, o procurador-geral que denunciou Aécio e Temer (mas, também, Lula e Dilma) foi perseguido por jornalistas da Veja, da Band, Folha e do Estadão como um suposto esquerdista que difamava os “homens bons” do atual governo. Obviamente, a menos confiável ainda imprensa petista (Brasil 247, Diário do Centro do Mundo, Revista Fórum, etc.) teve exageros no mínimo tão hilários quanto.

Aécio, do PSDB, em apenas um telefonema ao corruptor Joesley Batista, pediu o equivalente a todo o valor que Lula teria recebido de propina nas reformas do sítio e do tríplex e foi absolvido pelo Senado. Quando Dilma, ainda presidente, tentou livrar Lula de Moro através da sua nomeação como ministro, centenas de milhares de pessoas saíram às ruas e o governo caiu dias depois. Quando Temer faz o mesmo com figuras como Moreira Franco e Eliseu Padilha (que o finado ACM costumava chamar de Eliseu Quadrilha), só se viu passividade. Da mesma forma, o ativismo e partidarismo pró-governo de Gilmar Mendes, que soltou vários presos do PMDB e de partidos da base aliada em poucos dias, não tem equivalente entre os ministros, mesmo aqueles que, no passado, tiveram ligações com o PT, como Dias Toffoli.

Assim, a imunidade que vemos entre os corruptos do PSDB e no alto-escalão do governo parece ter muito menos a ver com defeitos da Lava-Jato ou do juiz Sérgio Moro, mas com o fato de partidos como o PSDB aparelharem de forma muito mais eficaz as instituições, como o judiciário e a grande mídia, do que os “bolivarianos” do PT.

Se Lula ficar fora da disputa presidencial, o que é provável, o primeiro colocado nas pesquisas, pelo menos por enquanto, passa a ser Bolsonaro (PSL). São dois os caminhos possíveis para o representante da extrema-direita. Pode ser que suas intenções de voto murchem, pois sem Lula e a “ameaça comunista-bolivariana” para combater, grande parte do seu discurso perde o sentido. Não colaria acusar Geraldo Alckmin ou o banqueiro Henrique Meirelles de “socialistas vermelhos”. Outra hipótese é de que ele herde a maior parte dos votos de Lula, pois, assim como o ex-metalúrgico, Bolsonaro é visto como um candidato “antissistema”, ao contrário dos outros candidatos relevantes, que, com exceção de Ciro Gomes (PDT), afirmam ser de centro. Todos eles, de alguma forma ou outra, estiveram ligados à candidatura de Aécio em 2014, ou ao impeachment, ou ao governo Temer: Henrique Meirelles (PSD), Rodrigo Maia (DEM), Geraldo Alckmin (PSDB), Luciano Huck (Novo) ou Marina Silva (Rede). Se todos eles concorrerem, serão vários candidatos com alguma relevância disputando um nicho ideológico muito próximo, o que pode, mais uma vez, favorecer um outsider como Bolsonaro (PSL).

De qualquer forma, mesmo que algum candidato de centro-esquerda ou de centro-direita supere o extremismo de Bolsonaro, a vitória sem Lula teria um gosto amargo. Talvez, para a direita tradicional brasileira, fosse melhor que Lula tivesse sido absolvido. Para um tucano ou membro do MBL, nada seria mais gratificante do que derrotar Lula nas urnas e evitar que ele se transforme em “vítima” de um judiciário acusado de seletivo. Também existe algum perigo, para os tucanos e peemedebistas envolvidos em corrupção, que um candidato relativamente moderado, mas não tão envolvido com o sistema político, como Marina (Rede), Luciano Huck (Novo) ou mesmo Joaquim Barbosa (PSB) deem à Lava-Jato o apoio que não teve de Temer ou Dilma.

 

 

O assalto à Maria do Rosário: quem precisa dos direitos humanos?

Originalmente publicado em Seguinte: em 28 de Dezembro de 2017.

Mesmo na era das Fake News, poucas pessoas causam tanto rebuliço quanto Maria do Rosário, a deputada gaúcha assaltada ontem. Talvez em parte devido às diversas notícias falsas que circulam sobre ela, talvez devido às suas escaramuças com o deputado de extrema-direita Jair Bolsonaro, muitas pessoas comemoraram o fato nas redes sociais. Algumas, que até ontem ou anteontem estavam espalhando mensagens de amor cristão devido ao Natal, chegaram a lamentar que ela não tenha sido morta ou estuprada. É o cidadão de bem brasileiro.

Ok, pode ser que algumas dessas pessoas, mais ignorantes, tenham acreditado em alguma das notícias falsas sobre ela e a odeiem de forma “compreensível”. É difícil gostar de alguém que, no mundo das fake News, quer descriminalizar a pedofilia, chora a morte de bandidos que atiram na PM ou que propõe lei tornando obrigatório o acolhimento de presidiários nas ceias de natal das famílias brasileiras. Por outro lado, a população, sempre à procura de culpados fáceis, encontrou na deputada um bode expiatório para a crise de violência pela qual o Rio Grande do Sul passa. Enquanto a população se volta contra ela, outros políticos igualmente ou mais responsáveis, como o incompetente secretário de segurança gaúcho ou o presidente Temer, cujo indulto natalino mais generoso da história esvaziou os presídios com o objetivo de livrar a cara de seus correligionários presos por corrupção, podem ficar tranquilos enquanto a  população “queima a bruxa”.

Apresentadores de programas policiais, políticos demagogos e comentaristas, agora com o auxílio da internet, construíram uma percepção de que direitos humanos são algo como um bando de palhaços, geralmente estudantes de humanas, vestidos de camisetões hippies e sandálias de couro e que gostam de abraçar bandidos. Pelo menos, essa é a impressão que me fica depois de ouvir certos comentários sobre os direitos humanos. Ocorre que direitos humanos não são pessoas ou grupos, mas sim… direitos. Direitos que são inerentes a qualquer pessoa, simplesmente pelo fato de que elas são… humanas. Desde os séculos XVII e XVIII, uma série de pensadores, todos eles liberais (não socialistas ou comunistas), como Locke, Beccaria e outros, passaram a questionar certas práticas que então eram corriqueiras. Uma delas, a punição extremamente desproporcional para faltas leves, como furto de comida ou mesmo ser rabugento. A ideia que vem dessa época é de que as penas devem ser proporcionais aos delitos. Se a pena para roubo e latrocínio, por exemplo, for a mesma – digamos, a pena de morte – por que o bandido se sentiria coibido de, ao roubar, também não assassinar a vítima, pois a pena é igual? Da mesma forma, crimes não violentos, como o furto podem ser melhor combatidos com retaliações financeiras do que com chibatadas, amputações ou mesmo a prisão. Certos populismos penais brasileiros recentes têm invertido esse princípio: o tráfico de drogas, que não é, necessariamente, um crime violento, pode render até 15 anos, já o mais nefasto dos crimes, que é o homicídio, pode render apenas 6 anos de detenção.

Outra ideia fundamental é que as pessoas têm direito a um julgamento imparcial. Isso é fundamental em qualquer lugar civilizado. Espera-se que ninguém possa ser, por exemplo, sentenciado à morte na hora por policiais que não estão preparados para julgar. Por isso, execuções policiais (não mortes decorrentes de trocas de tiros, o que pode ser um mal necessário) devem ser condenadas. O que impede que inocentes sejam mortos ao serem confundidos com bandidos por policiais mal treinados e estressados por jornadas longas, falta de equipamento e salários parcelados? Assim, falas como as de Bolsonaro, que defende que policiais devem ser premiados por matarem, precisam ser condenadas. Note que você pode ser favorável à prisão perpétua (eu sou) ou à pena de morte (não sou), mas isso não impede que exista um julgamento justo para tal. Outras práticas horrendas, como a tortura com o fim de obter confissão – ignorando que sob o efeito da dor, as pessoas confessam as coisas mais absurdas – também foram banidas a partir do argumento desses filósofos. Como você pode notar, os direitos humanos não são feitos para “defender bandidos”, mas para defender qualquer pessoa da arbitrariedade, da injustiça e da opressão estatal. Se você quer que o Brasil não tenha “direitos humanos”, lembre-se dos países que são constantemente denunciados por violá-los: Coreia do Norte, Irã, Arábia Saudita, Venezuela, Estado Islâmico… só lugar bom, não?

Certamente, porém, a deputada tem alguma parcela de culpa nesse ódio que desperta de parte da população. Sua atuação é parcial e suspeito que ela não leve os direitos humanos tão à sério quanto ela faz parecer. Não a vi criticando o governo venezuelano pelas constantes violações dos direitos humanos por lá e já a vi elogiando Cuba, que, digam o que quiserem os esquerdistas, é uma ditadura autoritária, que desrespeita vários direitos humanos da população cubana. Da mesma forma, ela disse no Twitter que “não há democracia quando a direita ganha”. Ocorre, deputada, que direitos políticos também são direitos humanos. Numa democracia, espera-se que haja um saudável conflito e debate público entre posições de esquerda e de direita (e não estou falando nos extremismos, que não devem ser tolerados), bem como alternância de poder entre governos mais à esquerda e outros mais à direita, todos eles referendados pelo voto popular. Ao negar isso, a deputada defensora dos direitos humanos acaba defendendo uma terrível violação dos próprios direitos humanos.

Por que as coisas são tão caras no Brasil?

Originalmente publicado em Seguinte: em 14 de Dezembro de 2017

Qualquer pessoa que conhece outros países já deve ter notado que algumas coisas são muito mais caras no Brasil do que no exterior, especialmente eletrônicos, roupa, carros, gasolina, etc. Por outro lado, outras coisas costumam ser bem mais baratas por aqui – comida e aluguéis, especialmente. Brasileiros que vivem ou visitam os EUA não cansam de postar vídeos nas redes sociais estupefatos com o preço da gasolina. Um litro de gasolina lá sai, mais ou menos, por R$ 1,72, contra os mais de R$ 4,00 por aqui. Dizem, também, que é possível comprar um bom carro usado por 2 mil dólares, pouco mais de 6 mil reais. Celulares, notebooks, televisores costumam sair por cerca da metade do preço que encontramos aqui. Você já perguntou porque isso ocorre?

A explicação comum é a do imposto. A carga tributária dos EUA é de cerca de 27% da riqueza produzida, enquanto a nossa é de cerca de 34%. Ocorre que outros países desenvolvidos possuem cargas tributárias bem mais altas do que a brasileira, especialmente na Europa (chegando a cerca de 50% da riqueza em alguns casos, como na Dinamarca), e os preços desses itens são semelhantes aos americanos. Não parece ser o tamanho da carga tributária exatamente o problema, mas como ela é cobrada. Enquanto nos EUA e nos demais países ricos, os impostos costumam se concentrar sobre a renda, herança, propriedade, etc., aqui nos focamos em taxar diretamente o consumo. É só pensar na quantidade de impostos embutidos que qualquer produto por aqui possui (ICMS, PIS, IPI, etc.), que, normalmente, chegam a metade do valor do produto, enquanto vários países utilizam apenas um imposto sobre mercadorias, o IVA (imposto sobre valor agregado), que, normalmente, não passa de 20% do valor do produto, além de facilitar a burocracia. Por outro lado, o imposto de renda aqui é bem camarada. Um bilionário paga os mesmos 27% que um trabalhador qualificado, que ganha mais de R$ 5 mil, paga. Em alguns países, o imposto de renda dos ricos chega a cerca de 50%. Enquanto aqui o imposto sobre heranças é de cerca de 2%, nos EUA, passa de 40% às vezes.

O imposto ajuda, mas existem outros dois fatores muito importantes. Desde 1930, com a chegada de Getúlio Vargas ao poder, o Brasil iniciou uma política de tentar produzir aqui mesmo tudo que o país precisasse – o que fez com que o país se industrializasse. Ocorre que, muitas vezes, seria mais barato comprar o produto lá fora do que produzi-lo aqui – afinal, os gringos costumam ter mais experiência, tecnologia, mão-de-obra mais qualificada, etc. Assim, para evitar que as coisas do exterior suplantem os produtos nacionais, o governo brasileiro coloca tarifas altíssimas sobre importações. Se você encomendar alguma coisa do exterior pela internet, é provável que você pague mais de 100% de impostos sobre o valor do produto, o que torna os nossos produtos nacionais – em princípio mais caros – competitivos aqui dentro. Quando Collor iniciou a abertura econômica – mantida, em linhas gerais, até a crise de 2009 – ele dizia que o carro produzido no Brasil era uma carroça, caro e ruim. Não deixava de ser verdade. Economistas mais liberais, críticos a essa política de substituição de importações, falam nas “vantagens comparativas”. Segundo eles, cada país tem se especializado em produzir bem e barato algumas coisas, nas quais ele deveria se focar, comprando do exterior aquilo que não produzisse bem. Assim, a França se especializou em vinhos, o Japão em tecnologia de ponta, a Suíça em relógios e equipamentos de precisão, o Uruguai em laticínios e o Brasil em café, soja, mas, também, em aeronaves (as da Embraer estão entre as mais vendidas do mundo). Tentar se fechar ao mundo e produzir tudo aqui dentro seria, assim, a receita para a pobreza.

Bem, também existe o fato de que as margens de lucro no Brasil são muito elevadas. No caso da indústria automotiva, três vezes mais elevadas do que nos EUA. Em Paris, uma das cidades mais caras do mundo, um Big Mac sai mais barato do que nos shoppings brasileiros. Os empresários brasileiros costumam colocar os preços lá em cima, dentre outros motivos, porque o brasileiro aceita pagar mais caro. É a teoria psicológica do preço, também conhecida por “teoria da utilidade marginal”. Você já deve ter reparado que uma pizza doce custa a mesma coisa que uma pizza salgada, embora chocolate e morango sejam muito mais baratos do que camarão ou picanha. Por que o dono da pizzaria não cobra mais barato pela pizza doce, se ela é muito mais barata de produzir? Ora, por que ele faria isso se o consumidor aceita pagar tanto pela pizza doce? Esperto é ele, burro é o consumidor. É assim que funciona o mercado. Os preços costumam partir de um ponto que é o mais alto que o consumidor esteja disposto a pagar.

Mas não dá para só reclamar da tentativa brasileira de se industrializar. O incentivo à indústria, especialmente entre os anos 1930 e 1980, fez com que o Brasil tivesse uma economia extremamente diversificada e complexa, com cadeias produtivas semelhantes às de países de primeiro mundo. O Brasil ter uma economia tão complexa e diversificada faz com que o país se saia relativamente bem das crises pelas quais passa. É só olhar para vizinhos nossos, que dependem de poucos produtos. Quando o preço da carne ou do trigo despenca, a Argentina entra em colapso, o que também ocorre com a Venezuela, quando o petróleo passa a valer menos. Mesmo com a crise terrível da qual ainda estamos saindo, os setores que mais sofreram foram aqueles que dependiam mais dos incentivos do governo (indústria de petróleo, indústria automotiva, construção civil, etc.), enquanto setores como o agronegócio ou serviços não sofreram tanto. Essa é a vantagem de ter uma economia diversificada. Se um setor está mal, outro estará bem. Aliás, para uma cidade como Gravataí, que vive em torno da indústria metalomecânica e automotiva, a proteção à indústria nacional fez muito bem.

O Brasil não é tão corrupto quanto você imagina

Originalmente publicado no Seguinte: em 30 de Novembro de 2017.

Como eu já escrevi antes, o Brasil é um país paradoxal. Ao mesmo tempo em que mantém estruturas sociais incrivelmente arcaicas, descriminalizou a homossexualidade no começo do século XIX, reconheceu os direitos políticos das mulheres antes da França e foi o único país que lutou na Segunda Guerra cujas tropas não eram segregadas racialmente. Agora, somos um dos poucos países cujo judiciário consegue prender bilionários. Este país tem algo que é incrível e ninguém ainda conseguiu entender direito.

Financial Times contrastou o caso brasileiro com o mexicano em uma matéria do ano passado. Aqui, a economia ainda está em frangalhos – em parte devido à Lava Jato, o que talvez seja um remédio amargo e necessário – mas as instituições funcionam incrivelmente bem. O México, o outro gigante da América Latina, ao contrário, é dominado por cartéis, o judiciário é uma piada, mas vem tendo um bom desempenho econômico.

 

Depois que Temer foi pego fazendo o que não se deve, MBL, parte da imprensa (especialmente a Folha e o Estadão) e quase todas as associações empresariais rogaram para que o combate à corrupção pare para que não prejudique a incipiente luz no fim do túnel econômico. Bem, quem suportou três anos de crise, aguenta mais alguns meses. Se o resultado disso for uma economia limpa e instituições verdadeiramente imparciais, que se vá até o fim. O resultado poderia compensar, apesar de o “grande acordo nacional” proposto por Romero Jucá, finalmente parece estar fazendo com que as coisas voltem a ser como antes.

De qualquer forma, mesmo com os escândalos que se sucedem com alguma impunidade, especialmente entre os protegidos pelo Foro Privilegiado, o Brasil está longe de ser o país mais corrupto do mundo. A ONG Transparência Internacional, todo ano, publica um índice que procura medir a corrupção entre os países. Desde que começou a ser calculado, nos anos 90, o Brasil tem se saído relativamente bem. Obviamente, estamos muito longe de paraísos como a Dinamarca, Nova Zelândia ou Finlândia, mas também estamos igualmente longe de ser o país mais corrupto do mundo. Em 2014, entre 174 países, o Brasil era o 69º mais honesto. Ou seja, existem 105 países mais corruptos do que o Brasil. Estamos exatamente empatados com alguns países europeus, como Grécia e Itália. Quando olhamos para o nosso continente, verificamos que o Brasil é um dos países menos corruptos: na América do Sul, apenas Uruguai e Chile são mais honestos. A orgulhosa e europeizada Argentina amarga a 107º posição.

Bem ou mal, nosso país tem uma longa história de instituições mais ou menos democráticas, o que pode ajudar a explicar porque nossa corrupção não é tão horrível quando poderia ser. Acabei de ler um livro do cientista político Bolívar Lamounier, no qual ele pontua que, apesar dos pesares, a democracia representativa (ou seja a existência de um parlamento eleito de forma relativamente limpa) existe entre nós desde a primeira Constituição do Império, de 1824. Mesmo com as sucessivas rupturas institucionais (Proclamação da República, Revolução de 30, Estado Novo e Golpe Militar de 1964, nossa última dessas rupturas, que já tem lá seus 53 anos), a única vez em que o projeto de extinção da democracia representativa entre nós foi nos 7 anos do Estado Novo, a ditadura semifascista encabeçada por Getúlio Vargas entre 1937 e 1945. Mesmo os militares da última ditadura, apesar de fecharem o Parlamento algumas vezes e mudarem constantemente as regras do jogo para garantir a maioria da Arena, o partido governista, nunca pensaram em extinguir alguma forma de oposição consentida (então, materializada no MDB, ironicamente o grande protagonista dos escândalos atuais).

Então, a existência, ainda que turbulenta de certas instituições minimamente independentes desde a nossa independência pode garantir que, se levado a sério, o combate à corrupção pode prosperar no Brasil. Muitos dizem que nossa tendência cultural à corrupção e ao “jeitinho” veio de Portugal, mas olhem para nossos irmãos de além-mar hoje em dia: eles estão entre os 30 países mais honestos do mundo, muito próximos aos seus vizinhos europeus. Ou seja, não há nada em nossa cultura que nos predisponha a aceitarmos essa chaga social. “Que o Brasil se torne um imenso Portugal”, como dizia a canção do Chico.

 

Mapa da Transparência Internacional: Quanto mais vermelho, mais corrupto é o país.

 

Série de colunas sobre a violência em Gravataí (RS)

Postarei aqui no blog as colunas que venho escrevendo para o portal Seguinte:, da Região Metropolitana de Porto Alegre. Abaixo, uma série de análises do final de 2017 – quando a cidade de Gravataí – vizinha de Porto Alegre – sofreu uma explosão em seus indicadores de violência.

Parte 1: A disparada da violência em Gravataí e no Rio Grande (27 de Outubro de 2017)

Parte 2: Por que a violência explodiu em Gravataí? – Parte 1   (03 de Novembro de 2017)

Parte 3: Por que a violência explodiu em Gravataí? Parte 2 (09 de Novembro de 2017)

Parte 4: Por que a violência explodiu em Gravataí? Final – as janelas quebradas (16 de Novembro de 2017)