A volta do regime militar é a solução para a violência brasileira? A RBS, além de difundir valores antidemocráticos, desinforma.

Nos últimos tempos, parte da mídia tem se utilizado de suas concessões públicas para repercutir discursos criminosos de apologia a volta de um regime militar no Brasil. É o caso da RBS, um oligopólio de comunicação do sul do país que ganhou dezenas de concessões dos generais para servir como mídia oficial da ditadura, concessões estas mantidas até hoje. No vídeo abaixo, um comentarista de seu principal telejornal do estado de Santa Catarina exprime essas opiniões.

Ora, será que, apesar de criminosas, tais opiniões se justificariam em dados reais? Será que a privação das liberdades democráticas é um preço a se pagar por uma sociedade menos violenta e mais segura? Uma forma de responder a essa questão é comparando a violência em sociedades democráticas e não democráticas. Um bom indicador sobre a qualidade da democracia em diferentes países é o da prestigiada revista britânica The Economist. Quanto maior a pontuação, mais democrático é o país. A melhor medida da violência, segundo os especialistas no tema, é a taxa de homicídio por 100 mil habitantes ao ano. Ao contrário de outros indicadores de violência, o homicídio é relativamente mais preciso. Por exemplo, um maior registro de roubos pode não querer dizer que há mais roubos, mas sim que as pessoas estão registrando-os mais. Um corpo, por sua vez, não costuma deixar muitas dúvidas.

Coloquei o resultado do cruzamento de ambos em um gráfico de dispersão.

democracia e violência

Cada pontinho no gráfico representa um país. O Brasil está indicado como o ponto vermelho. No eixo vertical, temos a taxa de homicídios, melhor indicador da violência, enquanto no eixo horizontal temos o nível de desenvolvimento da democracia (geralmente se considera que até 4 pontos o país é uma ditadura, de 4 a 6 uma anocracia – um regime híbrido que não é nem democrático, nem ditatorial – de 6 a 7 uma democracia imperfeita – o caso do Brasil – e acima de 8 temos democracias plenas). Não há dados para todos os países, logo, só pude colocar no gráfico os países para os quais ambos os dados estavam disponíveis relativos ao ano de 2012. A linha amarela representa a regressão (um teste estatístico pelo qual tentamos explicar uma variável por outra, no caso, a grau de violência pelo quanto uma sociedade é democrática). De forma simples, é possível dizer que ela resume os pontos, indicando a tendência.

Então, que conclusões podemos tirar? Apesar de ditaduras serem um pouco menos violentas do que as sociedades anocráticas (que tem governos que não são nem ditatoriais nem democráticos, como a Venezuela, por exemplo), a tendência é que, quanto mais democráticas as sociedades são, menos violentas elas se mostram. Quase todas as sociedades com os menores índices de homicídios (próximos ou abaixo de 1 por 100 mil habitantes) são sociedades plenamente democráticas.

Ao invés de regredirmos ao passado, a solução para a violência passa por aprofundarmos nossa democracia. Talvez os oligopólios de comunicação tenham medo disso, já que engordaram bastante sob as botas que lambiam.

A maioridade penal no Brasil ocorre mais tarde do que nos outros países?

É comum ouvirmos jornalistas e políticos afirmando que a maioridade penal no Brasil ocorre mais tarde do que na média de outros países. Constantemente, vemos algum apresentador de programa policial “mundo cão” afirmar que “na Inglaterra a maioridade penal é com 10 anos” ou um político em campanha dizer que “na França, bandido de 13 anos vai para cadeia”. Na verdade, porém, isso é uma confusão de conceitos. Segundo a Unicef:

“Diferentemente do que alguns jornais, revistas ou veículos de comunicação em geral tem divulgado, a idade de responsabilidade penal no Brasil não encontra-se em desequilíbrio se comparada à maioria dos países do mundo. De uma lista de 54 países analisados, a maioria deles como discutido a seguir, adota a idade de responsabilidade penal absoluta aos 18 anos de idade, como é o caso brasileiro. No entanto, tem sido fonte de grande confusão conceitual o fato de que muitos países possuam uma legislação especifica de responsabilidade penal juvenil e que portanto, acolham a expressão penal para designar a responsabilidade especial que incide sobre os adolescentes abaixo dos 18 anos. Neste caso, países como Alemanha, Espanha e França possuem idades de inicio da responsabilidade penal juvenil aos 14, 12 e 13 anos. No caso brasileiro tem inicio a mesma responsabilidade aos 12 anos de idade.”

Para tornar a comparação mais atraente visualmente, coloquei a informação sobre a maioridade penal em diferentes países na forma de gráfico. 10410821_831922976839588_7371468334008496911_n

Pode até existir algum bom argumento favorável à redução da maioridade penal, mas esse de que “na maioria dos países é assim”, tão utilizado por políticos demagogos e jornalistas sensacionalistas, não é um deles.